Força e fraqueza na denúncia de Janot
A segunda denúncia do procurador-geral da República contra o presidente Temer saiu mais forte do que a primeira, não só por reunir dois crimes – organização criminosa e obstrução de Justiça –, como também por estar mais bem trabalhada. No entanto, vai chegar ao Congresso mais enfraquecida, tanto pelos problemas surgidos em torno da delação de executivos da JBS, quanto pelo desgaste sofrido pelo próprio Janot, tanto no enfrentamento com Temer e a cúpula do PMDB quanto com a cúpula do PT e de outros partidos.
A exemplo da primeira denúncia, por corrupção passiva, a segunda vai monopolizar as atenções do Palácio do Planalto e da Câmara, à qual será submetida a Solicitação para Instauração de Processo (SIP). Novamente, o governo vai tender a trabalhar para que a decisão da Câmara seja tomada com celeridade, e o fantasma de Janot seja retirado do caminho o quanto antes. São mínimas as chances de a nova denúncia ser aceita pela Câmara.
A primeira denúncia chegou à Câmara em 29 de junho e foi votada na Comissão de Constituição e Justiça em 13 de julho. Com as atividades interrompidas para o recesso do meio do ano, o parecer vencedor do deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG) foi votado no plenário em 2 de agosto. Descontado o período de recesso, foram 16 dias corridos de tramitação.
O ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, decidiu submeter ao plenário o envio da segunda denúncia à Câmara, considerando que a Corte vai julgar, na próxima quarta-feira, 20 de setembro, a ação da defesa de Temer pela rescisão do acordo de delação premiada dos integrantes do grupo J&F. Janot fez pedido semelhante, relativamente a Joesley Batista e a Ricardo Saud.
É provável que na quinta ou sexta-feira a solicitação esteja seguindo para a Câmara. Com isso, é razoável que a decisão dos deputados ocorra na primeira quinzena de outubro. Até lá, a atividade legislativa ficará restrita ao essencial (medidas comprovadamente urgentes e relevantes).
Organização criminosa
A segunda denúncia, segue a linha do inquérito da Polícia Federal e coloca Temer como chefe ou coordenador de uma organização criminosa, da qual fazem parte os ministros Eliseu Padilha e Moreira Franco, o ex-ministro Geddel Vieira Lima e os ex-deputados Eduardo Cunha, Henrique Eduardo Alves e Rocha Loures, todos denunciados.
Cunha, Alves e Geddel estão presos, enquanto Loures cumpre prisão domiciliar. A vinculação de Temer a esses nomes, todos do PMDB, configura a associação, que funciona bem para efeito externo. A partir de 2006, o grupo teria recebido R$ 587 milhões, em propina e desvio de recursos.
Na acusação de obstrução de Justiça, Temer aparece ao lado de Joesley Batista e do executivo Ricardo Saud, da JBS.
Fragilidades
A denúncia de Janot sofre o desgaste do procurador, depois de quatro anos à frente do Ministério Público e de transformar o combate à corrupção no meio político em obsessão. O desgaste teve como ponto alto o acordo de delação premada da JBS, que contou com a atuação suspeita do ex-procurador Marcelo Miller, ex-braço direito de Janot.
O procurador-geral se antecipou aos ataques mais pesados que estariam por vir do ministro Gilmar Mendes do STF, o primeiro a apontar a duplicidade de papéis de Marcelo Miller, e da defesa de Temer. Janot pediu a prisão de Joesley, Ricardo Saud e do ex-procurador (a de Miller não foi autorizada por Edson Fachin) e a rescisão do acordo de delação premiada, que vai ser decidira pelo STF.
A investigação deste caso pode não comprometer Rodrigo Janot, mas as suspeitas dão aos aliados de Temer elementos para um discurso agressivo, do qual não dispunham no debate sobre a primeira denúncia.