PIB em queda; discurso pró-reformas em alta

O IBGE divulga na quinta-feira do resultado do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre. É um dado visto pelo retrovisor, que tende a confirmar as perspectivas sombrias para o desempenho da economia brasileira neste ano. A linha mestra da repercussão do resultado do PIB é previsível: o Brasil precisa de reformas.

A exemplo dos últimos anos, em 2019 o Brasil está patinando na casa de 1,0% de crescimento. Após dois anos (2015 e 2016) de retração da ordem de 3,5%, o PIB cresceu 1,0% em 2017 e 1,1% em 2018. Alguns analistas ainda temem pelo pior, com o crescimento negativo do produto neste ano. Já tem gente falando em ra,ecessão, mas o consenso só existe na avaliação do quadro de estagnação econômica.

A pesquisa Focus, que o Banco Central realiza semanalmente com instituições do mercado financeiro, apontou, nesta segunda-feira, a 13ª redução na projeção do PIB para este ano, que atingiu 1,23%.

Instituições multilaterais como a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e o Fundo Monetário Internacional (FMI) já revisaram para baixo o crescimento da economia brasileira. A OCDE estima crescimento PIB de 1,9%; o FMI, de 2,1%. As duas instituições preveem um crescimento menor da economia mundial, mas menor ainda do Brasil.

A divulgação dos primeiros números oficiais sobre o desempenho do PIB brasileiro em 2019 vai ser seguida pela repercussão do resultado junto aos agentes econômicos. Em condições normais de pressão e temperatura, os números devem dominar o noticiário de quinta-feira.

Não se deve esperar diagnóstico muito diferente do mercado e, particularmente, do ministro da Economia, Paulo Guedes: enquanto não realizar as reformas necessárias, o Brasil vai ficar patinando nesse crescimento econômico medíocre.

Este pode ser um mecanismo de pressão sobre o Congresso para aprovação da reforma da Previdência, mais efetivo do que as manifestações de rua deste domingo. Não é que a reforma vá ter esse poder transformador logo que for aprovada. Mas pode ser o início do rompimento com esta mesmice em que estamos metidos.

Reforma da Previdência: Comissão encerra fase de audiências

A comissão especial da Câmara que analisa a Reforma da Previdência realiza, nesta semana, as três últimas audiências previstas no plano de trabalho do relator, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP). Outro marco importante nos trabalhos da comissão temporária é o fim do prazo para apresentação de emendas, na quinta-feira, 30.

As audiências públicas programadas vão tratar da aposentadoria de mulheres, a primeira, do regime de capitalização e avaliação atuarial, a segunda, e da transição e desconstitucionalização, a última.

Em relação às emendas, cujo prazo inicial, de 23 de maio, foi prorrogado pelo presidente do colegiado, deputado Marcelo Ramos (PR-AM), elas somavam hoje 54. Cada emenda deve contar com um mínimo de 171 assinaturas.

A comissão prevê, ainda, a realização de um seminário internacional na semana que vem. A entrega do parecer do relator, como tem reiterado por Marcelo Ramos, está marcada para 15 de junho. A partir daí vai se intensificar a corrida por votos.

O texto de Samuel Moreira, que na técnica legislativa recebe o nome de substitutivo, vai ser votado ainda em junho na comissão especial, devendo ser submetido ao plenário da Câmara, em dois turnos de votação, antes do recesso de meio de ano, que tem início em 18 de julho.

Entre a deliberação da comissão especial e a entrada na ordem do dia do plenário vai se dar o esforço concentrado para a obtenção dos votos necessários à aprovação da matéria. São necessários 308 votos, que correspondem a três quintos ou 60% do número total de deputados.

Alerta: Não é prudente iniciar a votação com previsão de menos de 330 deputados favoráveis. Acidentes de percurso podem colocar tudo a perder.

É preciso lembrar que, além de votar o texto base, a Câmara deve se manifestar em relação aos destaques apresentados, geralmente pela oposição. Compete à parte  interessada (digamos assim, ao governo) reunir 308 votos para manter o texto destacado, que pode tratar da idade mínima, da pensão por morte ou de qualquer ponto contido no substitutivo.

A votação de propostas de emenda à Constituição, sobretudo as que tocam em temas de interesse social, como a Previdência, exigem fôlego redobrado de quem as propõe e/ou defende (digamos assim, o governo).

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Publicado no site “Os Divergentes”

CCJ mostra força e aprova reforma tributária

A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara comemorou a aprovação da admissibilidade da proposta de reforma tributária (PEC 45/19) como se fosse um gol de placa. Razões para isso não faltaram ao presidente do colegiado, deputado Felipe Francischini (PSL-PR).

O governo não deu confiança para o debate instalado na CCJ, que discutiu os aspectos formais da proposta, não só por estar focado na reforma da Previdência, como também porque pretende enviar ao Congresso uma proposta para o sistema tributário elaborada no Ministério da Economia.

Assim, com o apoio do colegiado, Francischini encaminhou a discussão em processo, coroado pela aprovação simbólica, sob aplausos, do parecer do deputado João Roma (PRB-BA), na tarde desta quarta-feira, com o voto contrário apenas do PSOL.

O deputado Ivan Valente (PSOL-SP) se manifestou contrariamente à matéria, defendendo a suspensão da tramitação da reforma da Previdência e a continuidade da discussão da tributária.

Os demais partidos declararam apoio à PEC da reforma tributária. Alguns, como o PT, adiantando que vão propor uma série de mudanças e a inclusão de tópicos na etapa da comissão especial, a ser criada pelo presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ). Outros, como o MDB, saudando o primeiro passo dado pela PEC (o da CCJ), mas observando que a mudança no sistema tributário é muito difícil de ser votada no mérito.

É pouco provável que Rodrigo Maia crie a comissão especial antes de o colegiado da reforma da Previdência votar o parecer do relator de lá, o deputado Samuel Moreira (PSDB-SP). O próprio presidente da Câmara já disse que a comissão da reforma tributária seria instalada quando a PEC da Previdência fosse para o plenário. Mas as coisas mudam e as avaliações de conjuntura têm prazo de validade muito curto.

Simplificação Tributária

Foi o deputado Renildo Calheiros (PCdoB-PE) quem disse, no debate desta quarta-feira na CCJ, que não estava em discussão uma reforma tributária, mas um projeto de simplificação de impostos. Calheiros ressaltou que aquele não era um projeto do governo, mas de uma instituição independente.

Concebida pelo Centro de Cidadania Fiscal, que tem entre seus dirigentes o economista Bernard Appy, e formalizada pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP), a proposta substitui cinco impostos de âmbito federal, estadual e municipal pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).

O objetivo é certamente o da simplificação, mas isso não retira da proposta o caráter reformista. Há pelo menos 30 anos se ouve falar na necessidade de realização de uma reforma tributária. De 1988 para cá, a complexidade do sistema só aumentou, a ponto de o ex-deputado Luiz Carlos Hauly, uma espécie de Dom Quixote da reforma, chamar o sistema de “sanatório tributário”.

Outros efeitos esperados pelos proponentes são a redução do contencioso tributário e do custo burocrático de recolhimento dos tributos, a melhoria do ambiente de negócios, um significativo aumento da produtividade e do PIB potencial. O IBS substituiria os seguintes impostos:

▪ Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) - federal;
▪ Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias (ICMS) - estadual;
▪ Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) - municipal;
▪ Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) - federal; e
▪ Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) - federal.

De acordo com a argumentação contida na proposta inicial, o IBS terá as características de um imposto sobre o valor adicionado (IVA). O modelo, segundo os autores, seria adotado pela maioria dos países para a tributação do consumo de bens e serviços.

A proposta assegura a preservação da autonomia de estados e municípios no sistema. Estes manteriam o poder de gerir suas receitas através da alteração da alíquota do IBS.

A questão da autonomia dos entes federativos é crucial no debate da reforma. Caso os governadores e prefeitos não se convençam de que não vão perder receita, a proposta será mais uma a ser arquivada.

A proposta sugere dois mecanismos de transição, com vistas ao ajuste suave das empresas e das finanças estaduais e municipais: a substituição dos tributos atuais pelo IBS e a distribuição da receita do IBS entre os estados e os municípios.

Sustenta, ainda, a substituição dos critérios de vinculação e partilha de receita do IPI (fonte de receita para os fundos de participação dos estados e municípios), do ICMS (arrecadado pelos estados e partilhado com os municípios), do ISS, da Cofins e do PIS por um sistema flexível na gestão do orçamento e transparente para os contribuintes.

Fantasma do apagão orçamentário entra na cena política

Um fantasma ronda o governo federal. Não se trata do fantasma do comunismo, que Karl Marx e Friedrich Engels materializaram no “Manifesto” de 1848 (“Um fantasma ronda a Europa”...), mas o fantasma do apagão orçamentário, o shutdown, conforme a definição clássica. 

O governo precisa aprovar, até o final de junho, um projeto que abre ao Orçamento um crédito suplementar de R$ 248,9 bilhões. Com a aprovação do crédito, o Poder Executivo estaria obtendo do Congresso uma autorização para o descumprimento excepcional da regra de ouro orçamentária, que preconiza um resultado corrente equilibrado.

Por Regra de Ouro entende-se os dispositivos legais que vedam a realização de operações de crédito que excedam as despesas de capital (investimentos, inversões financeiras e amortização da dívida). O princípio está no artigo 167, inciso III da Constituição.

Caso o governo venha a descumprir a regra, o presidente da República incorre em crime de responsabilidade, que é passível de abertura de processo de impeachment. Este não é um risco iminente, mas não pode ser descartado, sobretudo porque estamos falando de um governo confuso, desarticulado e fraco.

Esta situação já vinha se desenhando há alguns anos. Estudo especial da Instituição Fiscal Independente (IFI), vinculada ao Senado, registra um gradativo recuo da margem de cumprimento da regra fiscal desde 2013. Publicado em abril do ano passado, o estudo pode ser consultado na página da IFI na internet.

A partir de 2014, os sucessivos déficits primários (relação entre receita e despesas excluindo os juros) passaram a exercer pressão para o aumento das operações de crédito, que configuram endividamento.

Analista da IFI, Daniel Couri considera que a Regra de Ouro convive muito mal com resultados primários negativos. “Enquanto houver déficit primário a conta vai ser alta”, diz. Vale lembrar que o inédito descumprimento da regra previsto para este ano tende a se repetir, assombrando ainda mais este e, quem sabe, outros governos. Segundo simulações da IFI, a Regra de Ouro pode ser descumprida até 2024.

Sinal de alerta

Em dezembro de 2017, a Secretaria do Tesouro Nacional lançou, no relatório de política fiscal, o Painel da Regra de Ouro da União, mostrando a [baixa] suficiência para o seu cumprimento.

As estimativas davam conta de descumprimento em 2018, mas a entrada de receitas financeiras, como o pagamento de empréstimo à União pelo BNDES, permitiu o cumprimento da Regra de Ouro, com margem de R$ 35,8 bilhões.

Certa de que a bomba iria estourar em 2019, a equipe econômica do governo passado resolveu evitar o pior. Assim, concebeu a ideia do projeto de crédito suplementar para descumprir a regra. Isto porque o artigo 167 III da Constituição admite a realização de operações de crédito superiores às despesas de capital, desde que autorizadas mediante crédito suplementar aprovado pela maioria absoluta do Congresso.

Ao invés de propor um Orçamento deficitário, o que seria desastroso, a equipe lançou receitas condicionadas. A solução engenhosa contou com previsão na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2019, adotada na Lei Orçamentária em vigor, condicionando R$ 248,9 bilhões do Orçamento Fiscal e da Seguridade à aprovação de créditos adicionais, nos termos do dispositivo constitucional.

O governo atual enviou o projeto ao Legislativo em março, propondo trocar despesas de alto valor concentrado por emissão de títulos de responsabilidade do Tesouro. Daniel Couri observa que são despesas relevantes do ponto de vista fiscal e sensíveis do ponto de vista social. Veja algumas das despesas elencadas:

▪ Benefícios Previdenciários Urbanos – R$ 201,7 bilhões;
▪ Benefícios de Prestação Continuada (BPC) e de Renda Mensal Vitalícia (RMV) – R$ 30 bilhões;
▪ Programas de Transferência de Renda – R$ 6,5 bilhões;
▪ Subvenção Econômica em Operações do Programa de Sustentação do Investimento (PSI) – R$ 3,5 bilhões.

A vez do Congresso

Não vai ser fácil para o governo ter essa matéria aprovada no Congresso, não só pela exigência de quórum qualificado (257 deputados e 41 senadores) em sessão conjunta do Congresso. As dificuldades de articulação vêm sendo um lugar comum no relacionamento do Executivo com o Legislativo.
A necessidade de aprovação até junho não é uma exigência legal. É que, a partir de julho e nos meses subsequentes, as dotações orçamentárias dos programas indicados no projeto começam a se esgotar.

Relator da matéria, o deputado de segundo mandato Hildo Rocha (MDB-MA) rejeita a classificação das pressões de blocos parlamentares informais sobre o governo como chantagem e diz que elas fazem parte do jogo político. Ele não considera a hipótese de apagão na administração pública, mas admite o desligamento em alguns setores.

O deputado não acha que o Congresso deva ser responsabilizado por eventual descarrilamento da execução orçamentária. Na sua opinião, o ônus deve caber ao governo, que teria tido tempo, desde quando foi eleito, para mudar essa situação. Ele lembra que o Orçamento deste ano, aprovado em 2018, foi sancionado pelo presidente Bolsonaro.

Hildo Rocha, que vem conversando com a equipe do Ministério da Economia, apoia a aprovação do crédito suplementar atípico, mas defende a utilização de outras fontes de recursos que não as contidas no projeto do Executivo. Ele cita recursos do superávit financeiro (R$ 160 bilhões, segundo as informações de que dispõe), de restos a pagar (R$ 90 bilhões) e até das reservas internacionais (US$ 392 bilhões), por estarem aplicadas no exterior com baixa remuneração.

Consultores da Consultoria de Orçamento da Câmara, que estão debruçados sobre a análise do projeto e sua tramitação, observam que o rombo pode não ser dessa magnitude (R$ 248,9 bilhões), lembrando que o Relatório Bimensal de Avaliação de Receitas e Despesas divulgado em dezembro pelo Tesouro, fez uma estimativa de insuficiência da ordem de R$ 100 bilhões.

Um desses técnicos chamou atenção para a importância deste ponto, lembrando que governo e Congresso precisam chegar a um denominador comum. “O que está em jogo”, diz, “não é a autorização para despesas, mas para o descumprimento da Regra de Ouro”.

Audiência e votações

Por iniciativa do relator, a Comissão Mista do Orçamento vai realizar uma audiência pública, nos próximos dias, para subsidiar a análise do projeto. A audiência deve ter a participação de representantes da Secretaria do Tesouro, do TCU, de especialistas em finanças públicas e da Auditoria Cidadã.

O projeto precisa ser votado primeiramente na Comissão do Orçamento. No plenário, como lembra Hildo Rocha, a pauta das sessões conjuntas está trancada pelos vetos presidenciais (o portal do Congresso contabiliza atualmente 23 vetos a serem votados) e a oposição pode obstruir as votações, tornando-as excessivamente arrastadas.

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Texto publicado no site “Os Divergentes” - osdivergentes.com.br