Relator propõe mudanças que vão além do combinado

O Senado deve mexer mais do que o previsto na Reforma da Previdência, como indica o parecer do relator da matéria, senador Tasso Jereissati (PSDB-CE).
O relator da Reforma da Previdência no Senado, Tasso Jereissati (PSDB-CE), dividiu a proposta em três partes: 

A primeira, contendo o eixo central da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) recebida da Câmara, deve ser aprovada e encaminhada à promulgação, em solenidade, geralmente, pouco concorrida.

A segunda parte, no fracionamento concebido pelo senador cearense, é composta pela supressão de dispositivos aprovados na Câmara, cuja destinação será o arquivo do Senado. A supressão surpreende. Estão nesse terço a redução do valor de novos benefícios de prestação continuada (BPCs), o endurecimento da aposentadoria especial de trabalhadores em atividades insalubres e o impedimento de estados e municípios cobrarem alíquotas extraordinárias de Previdência em caso de déficit
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A terceira fração vai constituir uma nova PEC, a chamada PEC Paralela, a ser votada no Senado e encaminhada para análise da Câmara.

Deste terceiro terço vão constar a inclusão de estados e municípios na área de abrangência da reforma e outras sugestões do relator, a exemplo da garantia do piso para pensionistas com filhos menores de idade, o aumento de no mínimo 10% no valor da aposentadoria por incapacidade em caso de acidente de trabalho, a manutenção de um mínimo de 15 anos de contribuição com vistas à aposentadoria para homens e mulheres (a Câmara aprovou 20 anos para homens), para quem já está no mercado de trabalho e para quem vier a ingressar. Jereissati ainda propõe a reabertura do prazo para servidores federais optarem pelo regime de previdência complementar, o Funpresp.

Como medida compensatória, o relator propõe cobrar contribuição previdenciária de empresas exportadoras do agronegócio e de entidades filantrópicas da área de saúde e educação. Também sugere que empresas beneficiadas pelo Simples paguem a parcela da contribuição previdenciária relativa a acidente de trabalho.

A criação de receitas compensatórias, por meio da cobrança de contribuição previdenciária para o agronegócio exportador, não é novidade. Havia sido tentada pelo relator da reforma na Câmara, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), mas foi retirada do parecer antes da votação na comissão especial. Não passaria, assim como não passará.

Em linha com o ministro da Economia, Paulo Guedes, que privilegiou o impacto fiscal das mudanças previdenciárias, Jereissati fala em um impacto de sua proposta de R$ 1,350 trilhão em dez anos. As mudanças que sugeriu certamente não estão de acordo com o que pretendia Guedes.

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Publicada no site “Os Divergentes

Convicção no Senado é de que reforma vai ser aprovada

A aprovação da Reforma da Previdência no Senado é uma questão de tempo, tanto para os senadores que se colocam a favor da proposta como para aqueles que se opõem a ela.

O condicionamento do exame da reforma à aprovação de propostas entendidas como parte do Pacto Federativo, como sugere o senador Otto Alencar (PSD-BA), não parece sustentável. Se houver empenho em favor das medidas alinhadas no pacto, como o fim da Lei Kandir e a descentralização de recursos da cessão onerosa de petróleo, a resistência de Alencar e de outros que vierem a cerrar fileiras em defesa dos estados e municípios tende a se desfazer

A preocupação com as declarações polêmicas do presidente Jair Bolsonaro sobre os mais variados temas, preferencialmente os mais polêmicos, preocupa os senadores que trabalham para viabilizar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Previdência, para os quais melhor seria que Sua Excelência permanecesse de boca fechada. Se fossem o Rei da Espanha diriam “Por qué no te calas?”, como disse o Rei Juan Carlos ao presidente da Venezuela, Hugo Chaves, na Conferência Ibero-Americana de 2007. Mas são senadores e sob o presidencialismo.

Não é por isso, contudo, que a oposição vai pedir a intensificação dos impulsos verborrágicos do presidente da República, com os quais não há quem possa. Seria colocar o país permanentemente de pernas para o ar.

A indicação do deputado Eduardo Bolsonaro para embaixador nos Estados Unidos, que ainda não chegou ao Senado, certamente aumentaria as críticas ao governo, mas não impediria a votação da Previdência. Afinal, a Câmara e o Senado vêm se mostrando muito mais empenhados em aprovar a reforma do que o presidente Jair Bolsonaro.

“A aprovação da Reforma da Previdência é jogo jogado no Senado”, avalia uma experiente profissional da cobertura das atividades da Câmara Alta.
O mais provável é que os adversários da reforma, assim como aqueles que pretendem fazer mudanças nos dispositivos propostos, procurem novas brechas na PEC Paralela, que deve começar a tramitar após a promulgação do texto principal, inicialmente para estender as mudanças no regime previdenciário dos servidores públicos a estados e municípios.

Calendário - O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), a presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, Simone Tebet (MDB-MS) e o relator da reforma, Tasso Jereissati (PSDB-CE), definiram um calendário que considera razoável o prazo de 60 dias para tramitação da PEC no Senado. O marco inicial é o dia 8 de agosto, quando a proposta chegou ao Senado. Este calendário aponta a promulgação da PEC entre 8 e 10 de outubro.

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirma que uma proposta da importância da reforma não pode tramitar no Senado em menos de 70 dias, excluídos do cálculo as segundas e sextas-feiras. É muito provável que, diante de matéria tão abrangente, com tamanho impacto social e fiscal, a oposição tenha mais com o que se preocupar do que com dez dias no calendário.

Senado retoma as atividades com uma série de desafios

O Senado vai receber a proposta de Reforma da Previdência, em fase final de aprovação na Câmara, como o primeiro grande destaque da agenda do segundo semestre. Outros destaques foram apontados pelo senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidente da Casa, em pronunciamento por ocasião da retomada dos trabalhos legislativos. Nada, porém, tão pronto para a apreciação dos senadores quanto a Reforma da Previdência.

A inclusão de estados e municípios na reforma, como pedem, sobretudo, os governadores, deve ser alvo do que vem sendo chamado de PEC Paralela, mecanismo concebido pelos senadores para não retardar a promulgação do texto que vem da Câmara.

Não é a primeira vez que o Senado concebe uma PEC Paralela. Na reforma previdenciária de 2003, proposta no primeiro mandato do presidente Lula, medida cercada pelas mesmas preocupações (não retardar a promulgação do texto principal) terminou por suavizar dispositivos trazidos pela Emenda Constitucional nº 41/2003, a Reforma da Previdência de Lula.

Desta vez, a iniciativa do Senado deve ser mais sintonizada com a linha reformista adotada pelo governo, ainda que senadores como Roberto Rocha (PSDDB-MA) vejam no mecanismo uma forma de reagir ao “complexo de carimbador”, que se abate sobre a Casa quando a falta de tempo ou de conveniência política a impede de promover mudanças em texto aprovado pela Câmara.

Pacto Federativo

O presidente do Senado confere especial atenção à reformulação do Pacto Federativo, um tema que atravessou as últimas décadas sem que fosse alcançado pelos formuladores políticos. Davi Alcolumbre acredita que “agora vai”, com base em conversas que vem tendo com governadores e com o Executivo Federal. Como preside a Casa da Federação, Alcolumbre entende que esta iniciativa deve caber ao Senado, enxotando para bem longe o “complexo de carimbador”.

No discurso alusivo à retomada das atividades legislativas, o presidente do Senado sintetizou o novo pacto federativo como a “desvinculação de recursos do governo federal para estados e municípios”.

A definição de Davi Alcolumbre pode não ser a mais precisa para a pactuação de recursos e obrigações entre os entes federados, mas ajuda a explicar por que uma medida sonhada há mais de 30 anos por estados e municípios nunca prosperou. Em tempo de “vacas magras”, como o da atualidade, nada indica que tenha chegado a hora de um novo pacto.

Reforma Tributária

Se não bastasse a indisposição do governo federal em abrir mão de receitas para estados e municípios, o maior interesse pela Reforma Tributária desaconselha a abordagem do novo pacto federativo.

A reforma visa à simplificação da estrutura tributária e é vista como fundamental para tirar o país de um ciclo de crescimento econômico medíocre iniciado nos anos 80 e intercalado por períodos de recessão ou pela estagnação que atualmente vem tirando o sono do país.

Tramitam no Congresso propostas de Reforma Tributária na Câmara, elaborada pelo Centro de Cidadania Fiscal (CCiF) e formalizada pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP), e no Senado, do ex-deputado Luiz Carlos Hauly, que a Câmara aprovou em 2018. O governo federal também tem a sua proposta, da lavra do secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, mas ainda não a enviou ao Legislativo.

Ainda depende de detalhamento o anúncio feito por Alcolumbre de um acordo com o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), e com o ministro da Economia, Paulo Guedes, para a elaboração de um texto único, o que facilitaria a tramitação.

Conta a favor da ideia o bom relacionamento dos presidentes da Câmara e do Senado, que reduz a tradicional disputa entre as duas Casas. Pesa contra a complexidade do tema e o papel do Executivo nesse acordo.

Emendas mostram Câmara mobilizada em torno da reforma

As 277 emendas apresentadas à proposta de reforma da Previdência (PEC 06/2019) do Poder Executivo demonstram que a Câmara está mobilizada em torno da matéria e que a pauta é o carro-chefe dos trabalhos legislativos. Em comparação com a proposta do governo Michel Temer, o número de emendas é quase 60% maior. A PEC 287/16, que não chegou a ser votada no plenário da Câmara, recebeu 164 emendas.

Informações da Agência Câmara dão conta de que, do total de emendas à PEC do atual governo, 162 foram apresentadas na quinta-feira, 30, último dia do prazo, o que pode ser atribuído ao trabalho de formulação e de coleta de 171 assinaturas necessárias para apresentação de cada proposta.

A grande quantidade de emendas vai ter reflexo nos debates na comissão, quando o relator, Samuel Moreira (PSDB-SP), apresentar o seu parecer, o que deve se dar em torno de 15 de junho. Aparentemente, existe uma relação direta entre a quantidade de emendas e o interesse pela participação do debate.

Vai caber à Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados a classificação das emendas, trabalho que exige perícia e dedicação.

O PDT e o PL (antigo PR) propuseram emendas globais, que substituem o texto em análise. Segundo a Agência Câmara, o PDT rechaça as mudanças propostas pelo governo, por considerar que atingem as camadas mais pobres, e concentra o substitutivo no regime dos servidores públicos. Já o PL não diverge tanto na busca do que as suas lideranças chamam de um “sistema justo e fiscalmente sustentável”.

Os dois partidos defendem a manutenção das regras para o Benefício de Prestação Continuada (BPC), para a aposentadoria rural e para a aposentadoria especial dos professores. São pontos que foram alvo de muitas emendas e que não devem ser recepcionados pela comissão especial.

No caso do modelo de capitalização individual, de acordo com a Agência Câmara, PDT e PL propuseram sistemas solidários, com contribuição patronal e garantia de benefício mínimo. O modelo de capitalização também não deve permanecer em pé ao final do trabalho da comissão especial.

Força do lobby

O conjunto de emendas mostra a força do lobby de categorias profissionais, em propostas que saem em defesa de critérios diferenciados de aposentadoria. A pressão de policiais militares e bombeiros é conhecida de outras reformas da Previdência. A ela se juntam as guardas municipais.

Também são defendidos critérios diferenciados para policiais federais, legislativos, rodoviários federais, ferroviários federais e policiais civis, para agentes penitenciários e vigilantes.

Mereceram ou conquistaram emendas, sempre visando a critérios diferenciados de aposentadoria e contribuição, os profissionais que desempenham atividades insalubres, os enfermeiros, técnicos e auxiliares e enfermagem e as obstetrizes (as seculares parteiras).

É bom que se diga que há emendas que não se enquadram nas pressões corporativas e que procurar discutir formas de financiamento da seguridade e a unificação das regras de transição. Estas serão analisadas no devido tempo.

Curiosidades

Há uma emenda curiosa, que parece saída do cinema. Ela propõe que seja contado como tempo de contribuição o período de exercício da função de cuidador, da criança, do idoso e da pessoa portadora de deficiência, pela mulher ou pelo cônjuge (ela ou ele), independente do período de contribuição.

Quem teve a oportunidade de ver, este ano, o filme “A Suprema”, da cineasta Mimi Leder, há lembrar de causa semelhante, abraçada pela advogada Ruth Bader Ginsburg nos anos 1950.

Se há emenda que remete ao cinema, outras remetem ao eterno Stanislaw Ponte Preta, um cronista de costumes falecido em 1968, que nos deixou esta máxima, entre tantas outras: “Ou restaure-se a moralidade ou locupletemo-nos todos. ”

A Emenda 15 propõe, para efeito de aposentadoria, a simetria entre militares estaduais e militares federais. A Emenda 16 aplica aos policiais militares e aos bombeiros militares as regras de transferência para a inatividade e pensão por morte dos militares das Forças Armadas.

Com a palavra o relator.
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Publicada no site “Os Divergentes”